Terceiro Capítulo - Ela Veste Preto
Ela veste preto, mas o baile é em Paris. Cap. 03
“Há
dias em que o mundo gira ao contrário, mesmo sem voltar no tempo. Há dias em
que deveríamos desligar os sentimentos.”
Diário da Viagem de Dora. (D.D).
– Será que ele sabe no que tá se metendo! – sussurra
Romeo desacreditado no que vê. – O cara se diz o melhor detetive de New Park e
cai numa furada dessas...
O rapaz não sabia se atravessava a rua para
entender o que se passava ou deixava rolar até onde desse. Decidiu minutos
depois que interferiria no improvável encontro, estava prestes a fazer isso, se
não fosse pelo táxi que pegaram e sumiram sem deixar rastro.
– Droga! Pra onde foram aqueles dois? Eu não tenho
dinheiro pra táxi e metrô vai demorar uma eternidade! Preciso contar o que tá
rolando pro Alonso antes que aconteça uma tragédia! – grita o garoto em plena
praça no centro de Paris correndo de volta ao hotel.
Música –
Jack White – Love is Blindness – O amor é cegueira
O amor
é cegueira, eu não quero ver
Você
não vai embrulhar a noite em volta de mim?
Oh,
meu coração, o amor é cegueira.
Em um
carro estacionado, em uma rua movimentada
Você
vê o seu amor fez completa.
Tópico
está rasgando, o nó está deslizando
O amor
é cegueira.
No hotel, Dora e Alonso ainda discutem o destino da
indesejada família real.
– Minha mãe nos convidou para um café da manhã que
será também uma espécie de encontros às cegas! Claro, uma forma de me fazer
engolir a Sofi! Mas você aparecerá deslumbrante e acabará com os boatos e
cismas dela! – berra o príncipe empolgado.
– Como assim, amor? Nem parece que passamos essa
noite horrível de horas atrás! – admira-se Dora.
– Você disse bem, já foi! Agora vamos pensar no
futuro antes que não haja nenhum... Dona Corália reuniu toda imprensa nesse
encontro com a desculpa da breve passagem da realeza baviense por Paris. Mas
ela só quer desmoralizá-la perante meus olhos, a envergonhando pro reino e pro
mundo, te tirando do páreo pra sempre, eliminando...
– Já entendi! – grita a moça histérica
interrompendo as cobranças de Alonso. – Meu Deus! Como posso dar conta disso? –
pergunta aterrorizada.
– Ah! Meu amor... Você dará... É tão forte e
poderosa, mas nem se dá conta da luz que te cerca e encanta todo mundo que
toca! – defende o garoto deslizando os dedos pelos cabelos de Dora.
– Pelo jeito nem todo mundo... – brinca a menina.
– As pessoas certas... – cochicha o namorado.
– Pode deixar! Sua namorada estará lá na hora
marcada, sem atrasos, linda e majestosa juntamente com a acompanhante e amiga
inseparável! – responde Mell intrometendo-se no convite da colega.
– Claro Mell! Conto com sua ajuda nessa missão
bombástica! – diz Alonso rindo do modo torto que a garota achou de ir ao
evento.
Ambas se despediram dele indo atrás de produção
urgente que Mell jurava saber onde encontrar. O tempo passou rápido destacando
no relógio o horário do Café da Manhã as Cegas.
O amor
é relógio e aço frio
Dedos
muito entorpecer a sentir.
Aperte
o punho, soprar a vela
O amor
é cegueira.
O amor
é cegueira, eu não quero ver
Você
não vai embrulhar a noite em volta de mim?
Oh,
meu amor,
Cegueira.
– Onde está Sofi? Ela não estava tão interessada em
sentir a vibe da cidade luz? – indaga Alonso estranhado o sumiço da condessa
víbora.
– Querido, ela está se produzindo pra você! Quer
mostrar o que é uma dama de verdade... Coisa que parece que você já esqueceu
levando em conta suas novas companhias! – responde Dona Corália com repulsa na
voz.
– Papai como o senhor aguenta e aprova essas coisas
que a mamãe diz? Ela perdeu a noção do ridículo!
– Meu filho! Me calo e deixo que impere a falta de
senso! Com o tempo você verá que só assim se sobrevive a um casamento sem
enlouquecer... E antes que conteste, não é só com ela, mas todas as mulheres! –
diz o pai conformado entrando em seguida.
– Sou capaz de qualquer coisa pra não ficar como o
Senhor Inaldo! Dora, você vai ter que me salvar disso! – fala o moço irônico e
nervoso com os acontecimentos.
Uma
pequena morte sem luto
Nenhuma
chamada e sem aviso
Baby,
é uma ideia perigosa
Que
quase faz sentido.
Na hora marcada, um Bentley preto de vidro fumê
encostava-se à porta do salão para deixar duas adoráveis damas desconhecidas. A
impressa se alvoroçou para pegar o melhor ângulo investindo no que poderia ser
a capa dos tabloides semanais.
Logo, ambas desceram do carro se revelando com
belos vestidos matinais de luxo. A primeira vestia branco tomara que caia de
renda, sandálias discretas e coque no cabelo. Já a segunda usava uma blusa
preta combinando com a saia pregueada branca com um leve coberto preto, coque
de laço, sapatos finos bicolores e uma bolsa de mesma cor combinando.
Alonso, assim como todos os outros presentes, parou
para olhá-las. Nunca estiveram tão apresentáveis como naquele dia. O nível do
jogo havia se elevado, elas deixaram as mocinhas e projetos de New Park para
trás, nascendo ali damas de verdade.
– Mell não brinca em serviço... Nunca mais vou
desconfiar dela quando prometer algo surpreendente! – brincou o príncipe indo
buscá-las.
– Não mesmo... Pelo menos quando o assunto for moda,
pode confiar nessa cabeça oca pra sua agente secreta! – diz Dora mexendo com a
amiga em estado de graça.
Nem
bem pisaram no salão, Dona Corália foi sequestrá-la para o encontro ás escuras
que tanto havia falado. Mell aproveitou a deixa para reparar e imitar as
celebridades que chegavam a todo o momento.
– Tudo bem pra você esse negócio de encontros da
sua mãe? – quis saber a menina indignada.
– É só brincadeira beneficente! Começa assim e
termina com todo mundo dormindo de tão monótono que é... Super sem graça! –
respondeu o garoto tranquilamente.
– Já que tá tudo certo vou buscar inspiração por
aí... Como você consegue ficar normal sabendo que nessa mesma sala estão
atores, socialites, jogadores consagrados e mais gente que muitas pessoas
matariam pra ver de pertinho? – perguntou Mell babando.
– Você disse bem... São gente como nós! Pessoas em
vantagem por serem o que são, mas tão humanas quanto nós. Por isso cuidado com
elas! – alertou o rapaz piscando para a amiga que decidiu arriscar.
Na sala de encontros as moças estavam de um lado e
os rapazes de outro, protegidos por vidro fosco de onde era possível ver apenas
o vulto do oponente.
– Você fica aqui! Separei a mesa cinco
especialmente pra você! – diz a mãe de Alonso como quem já havia preparado o
pretendente que tiraria a oportunista do caminho de seu filho.
Dora
sentou e esperou pelo misterioso encontro quando ouviu a cadeira se mexer do
outro lado do vidro.
– Olá, bom dia! – cumprimentou a voz.
– Bom dia! – devolveu a menina pouco interessada.
– É a primeira vez que você vem a essas reuniões? –
quis saber curioso.
– É sim! Por quê? – perguntou mais animada.
– Porque pela entonação da sua voz parece que vai
há uma todo dia! – brinca.
– Hahaha! Não, é mais complicado que isso! –
explica docemente.
– Entendo! Coisas do coração... Você ama quem não
te ama, mas parecia amar. Aí tudo fica esquisito demais pra voltar pra zona da
amizade!
– Estranho...
– O quê?
– Não! Eu não te chamei... Só achei muita
coincidência essa história e você me contando... – fala Dora compulsivamente
até cair em si respirando profundamente e cortando gélida após perceber o fato.
– Hei! Hei! Rapaz... – chama desesperada sem obter resposta permanecendo na
mesa sem explicação pro que acabou de acontecer.
O amor
está se afogando em um poço profundo
Todos
os segredos, e ninguém para contar.
Pegue
o dinheiro, querida ...
Cegueira.
– Chateada com o encontro anterior? Me deixa
corrigir isso! – sussurra novamente outra voz vinda de trás do vidro.
– Quem é você? – indaga a garota na defensiva.
– Só um cavalheiro tentando alegrar uma senhorita
que precisa esquecer todo mal que fizeram a ela! – respondeu o vulto irônico
gesticulando.
– Ah, é! E como você sabe que me fizeram tão mal? –
devolveu Dora tremendo.
– Coisas assim não podem ser escondidas... Ficam na
gente! Amostradas em pequenos gestos, se soltam nos sorrisos falsos, exalam da
alma junto com as palavras... – dita calmamente a face obscura reavivando os sentimentos
guardados no interior dela.
A jovem estava perdendo o controle que recentemente
havia recuperado, levantando da cadeira prestes a explodir de dor por tudo que
se passava novamente na cabeça, dominando-lhe o corpo quase que por completo.
– Espera! Quero te dar um presente! – ordena o
misterioso pretendente.
No salão, Sofi atrasadíssima se juntava a Alonso.
– Nossa! Que demora! Não é do seu feitio se atrasar
assim pra dar o bote... Achei que você havia resolvido simplificar nossas vidas
indo aplicar o golpe em algum trouxa desavisado! – cumprimentou o príncipe
implacável.
– Pois se enganou! Não desisto fácil daquilo que eu
quero... Sua resistência só me motiva mais ainda, honey! – devolveu irônica
sorrindo para as fotos que não paravam de ser clicadas.
Nesse
momento, Leo Turner invadiu o evento quase sendo barrado pelos seguranças.
– Pode deixar! – gritou Alonso para liberar
passagem. – O que você está fazendo aqui, cara? Pensei que essa não fosse a
sua! Se queria um convite por que não me pediu? – perguntou Alonso intrigado.
– Não fazia a mínima ideia desse lugar! Quanto mais
que viria parar aqui... É que ingenuamente estava tentando descobrir a casa da
minha namorada pra mandar um presente, seguindo-a. Imagine a minha surpresa
quando ela entrou no nosso hotel, um tempo depois saiu toda produzida e agora
está na minha frente, numa festa granfina acompanhada por você! – berra o detetive
indignado. – Muito esquisito... Um recorde na escalada social pra alguém que
nem podia pagar o aluguel! – continua o rapaz chamando a atenção de todos.
Pouco depois, Romeo voa todo desgrenhado para
dentro da atração transformada em circo jogando desculpas no ar.
– Alonso, me desculpe! Só vi essa manhã... Se
soubesse antes teria avisado você! Vocês dois... Teria avisado todo mundo do
que essa maluca é capaz! – grita inconformado por ter chegado tarde demais.
– E você não fala nada, Adele? – indaga Leo dilacerado
com a descoberta.
– Adele? Mas ela se chama Sofi... – respondeu
Alonso.
– Isso mesmo! Sofi, Condessa de Ordália! Desculpe
se menti e quebrei seu coraçãozinho... Eu precisava pra atingir meus objetivos!
Senão, como ia saber o que acontecia na vida mais ou menos do meu amado
príncipe... Não foi nada pessoal... – explicou a garota mimada rindo e fazendo
beicinho.
O amor
é cegueira, eu não quero ver
Você
não vai embrulhar a noite em volta de mim?
Oh,
meu amor,
Cegueira.
A discussão continuaria se não fosse o estrondo que
ocorreu no fundo do salão. Quando os convidados viraram se depararam com Dora
enterrada no meio da mesa dos quitutes do café da manhã. Estava coberta de
bolos, doces e chás dispostos em cima de toalha e louça inglesa quebrada. O
vestido encharcado perdeu-se, seus olhos vazios quase não representavam vida,
todo o corpo estava inerte a não ser pela mão petrificada segurando um cartão
vermelho que trazia uma breve mensagem.
– “As férias acabaram! Nosso jogo recomeça aqui!”
Ass. R.
Música do Episódio: